Notícias dos Tribunais – 451

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – STJ

Distribuição dinâmica do ônus da prova permite afastar presunção de que proprietário fez benfeitorias no imóvel

​Com base na teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) que, em ação de divórcio litigioso, apoiado no artigo 373, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil (CPC), atribuiu ao ex-marido e coproprietário do imóvel o ônus de comprovar que as acessões e benfeitorias não foram realizadas na constância do casamento.

Para o colegiado, o TJPR – ao afastar a presunção legal relativa prevista no artigo 1.253 do Código Civil (CC) – adotou corretamente a distribuição dinâmica, em razão de peculiaridades que permitem ao coproprietário (o ex-marido é dono do bem em conjunto com terceiros), com maior facilidade do que a ex-esposa, demonstrar se as melhorias realizadas no imóvel tiveram ou não a participação dela.

O tribunal paranaense considerou que a existência de rupturas no curso do vínculo conjugal dificulta a comprovação de esforço comum nos melhoramentos feitos no imóvel. Além disso, o ex-marido, por ser coproprietário e possuidor, teria mais condições de comprovar que as benfeitorias não foram realizadas durante o matrimônio e, portanto, não deveriam ser submetidas à partilha.

No recurso especial, o ex-marido alegou que, segundo o artigo 1.253 do CC, a inversão do ônus da prova contraria a presunção relativa de que as benfeitorias existentes no imóvel foram realizadas pelo proprietário. Para ele, diante da ausência de indícios de que as acessões foram incorporadas com a participação da ex-mulher, caberia a ela provar os fatos que embasam o seu suposto direito.

Presunção relativa do artigo 1.253 do CC

O ministro Villas Bôas Cueva explicou que, segundo artigo 373, parágrafo 1º, do CPC, nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa, o magistrado pode atribuir o ônus da prova de forma diferente da prevista no caput do artigo, desde que o faça por decisão fundamentada.

Já o artigo 1.253 do CC, complementou, estabelece que toda construção ou plantação existente em um terreno é presumida como feita pelo proprietário e à sua custa, até que se prove o contrário.

De acordo com o ministro, contudo, a presunção prevista pelo artigo 1.253 do CC é relativa (juris tantum) e, por isso, pode ser apresentada prova em sentido contrário. No caso concreto, disse ele, essa prova se tornou fundamental para definir se as acessões e benfeitorias foram realizadas em períodos coincidentes com a relação matrimonial, para fins de definição da partilha.

“No caso, ademais, a presunção do artigo 1.253 do CC/2002, presente no direito das coisas (Livro III), deve ceder lugar a outra presunção legal muito cara ao direito de família (Livro IV), constante do artigo 1.660, incisos I e IV, do CC/2002, segundo a qual se presume o esforço comum dos cônjuges na aquisição dos bens realizada na constância da relação matrimonial sob o regime da comunhão parcial, situação em que os respectivos bens devem ser partilhados”, afirmou.

Distribuição dinâmica do ônus da prova concretiza princípio da persuasão racional do juiz

Em seu voto, Villas Bôas Cueva comentou que, para dar concretude ao princípio da persuasão racional do juiz, disciplinado no artigo 371 do CPC, em conjunto com os pressupostos de boa-fé, cooperação, lealdade e paridade de armas previstos no código processual, foi introduzida a faculdade de o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso entre os sujeitos do processo, em virtude de situações peculiares – a distribuição dinâmica do ônus da prova.

“Desse modo, é indiferente procurar saber simplesmente quem teria realizado as construções ou edificações no imóvel objeto do litígio, mas é imprescindível definir em que momento elas teriam sido realizadas, se na constância ou não da união conjugal, mostrando-se mais adequado carrear a produção dessa prova para quem é o (co)proprietário do imóvel – no caso, o ora recorrente”, concluiu o ministro ao manter o acórdão do TJPR.

https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/12042022-Distribuicao-dinamica-do-onus-da-prova-permite-afastar-presuncao-de-que-proprietario-fez-benfeitorias-no-imovel.aspx

 

Bem de família dado em caução de aluguel comercial é impenhorável, diz STJ

As hipóteses em que se admite a penhora de imóvel usado para moradia familiar devem ser interpretadas de maneira restritiva. Logo, o bem de família oferecido como caução em contrato de locação comercial não pode ser penhorado para pagamento de dívida de aluguel.

Com esse entendimento, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado por um casal de idosos com o objetivo de evitar a penhora do único imóvel que possuem e no qual residem.

O bem de família foi ofertado como caução para locação comercial em favor de terceiro, o qual ficou dois anos sem pagar aluguel. Para saldar a dívida, o credor pediu a penhora do imóvel, que foi autorizada pela Justiça paulista.

O Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que o casal perdeu o direito de invocar a impenhorabilidade do bem de família no momento em que, de livre e espontânea vontade, ofereceu-o como caução.

Embora a caução não conste nas exceções à impenhorabilidade listadas no artigo 3º da Lei 8.009/1990, o TJ-SP decidiu equipará-la ao instituto da hipoteca, que permite a execução sobre o imóvel oferecido como garantia real.

Esse entendimento seria plenamente aplicável nas hipóteses em que o bem de família é oferecido como fiança, conforme a jurisprudência do próprio STJ e julgamento recente do Supremo Tribunal Federal.

Essa aplicação não pode ser estendida ao caso em que o imóvel é oferecido como caução. Relator, o ministro Marco Buzzi destacou que fiança e a caução são institutos diferentes enquanto modalidades de garantia do contrato de locação.

Caução é o instrumento pelo qual o cumprimento de uma obrigação é garantida, por meio de um valor depositado ou bem dado em garantia. Já a fiança é uma garantia pessoal, que vincula a pessoa do fiador a arcar com a obrigação, em caso de dívida.

“Trata-se de mecanismos com regras e dinâmica de funcionamento próprias, cuja equiparação em suas consequências implicaria inconsistência sistêmica”, disse o ministro Buzzi.

Além disso, afirmou que o oferecimento de um bem de família em garantia não implica renúncia à proteção legal conferida ao mesmo. Para afastar a impenhorabilidade, seria necessário comprovar a violação da boa-fé objetiva, conforme já decidiu o STJ.

“A caução levada a registro, embora constitua garantia real, não encontra previsão em qualquer das exceções legais, devendo prevalecer a impenhorabilidade do imóvel, quando se tratar de bem de família”, concluiu o ministro Marco Buzzi.

Com o provimento ao recurso, o caso vai voltar ao TJ-SP, para que analise se o imóvel em questão é, de fato, um bem de família.

REsp 1.789.505

https://www.conjur.com.br/2022-abr-12/bem-familia-dado-caucao-aluguel-comercial-impenhoravel

 

 

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