SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – STJ
Competência da Justiça Federal em ações de improbidade se define pela pessoa, e não pelo objeto da lide
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a competência da Justiça Federal para as ações de improbidade administrativa é definida em razão da presença, na relação processual, das pessoas jurídicas de direito público previstas no artigo 109, I, da Constituição Federal (CF/1988), e não pela natureza federal da verba sujeita à fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU).
A decisão teve origem em ação de improbidade ajuizada por município maranhense contra um ex-prefeito, a fim de apurar possíveis irregularidades na prestação de contas de verbas federais decorrentes de convênio firmado com o Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais (Pronat).
No recurso submetido ao colegiado, o Ministério Público Federal defendeu que a presença do ente federal não poderia ser o único motivo para a manutenção do processo na Justiça Federal.
Competência em razão da pessoa ou em razão do interesse
O relator, ministro Mauro Campbell Marques, lembrou que a competência para ações de ressarcimento ao erário e de improbidade administrativa, relacionadas a eventuais irregularidades na utilização ou prestação de contas de repasses de verbas federais aos demais entes federativos, vinha sendo resolvida pelo STJ com base nas Súmulas 208 e 209 – ambas editadas pela Terceira Seção, responsável pela fixação da competência em matéria penal.
O primeiro enunciado define que “compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita à prestação de contas perante órgão federal”. O segundo prevê que “compete à Justiça estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal”.
O magistrado recordou ainda que a CF/1988, em seu artigo 109, IV, dispõe sobre a competência penal da Justiça Federal, especificamente para os crimes praticados em detrimento de bens, serviços ou interesse da União, suas entidades autárquicas ou empresas públicas. Dessa forma, segundo o relator, para se reconhecer a competência, em regra, bastaria haver o interesse da União, sem a necessidade de sua presença em qualquer dos polos da demanda.
Entretanto, ele destacou que o mesmo artigo, em seu inciso I, estabelece a competência absoluta em razão da pessoa (ratione personae), configurada pela presença, na demanda, dos entes elencados no referido dispositivo, independentemente da natureza da relação jurídica litigiosa.
“Nesse contexto, a aplicação dos referidos enunciados sumulares, em processos de natureza cível, tem sido mitigada no âmbito deste Tribunal Superior”, salientou o ministro.
Precedente: mitigação das Súmula 208 e 209 do STJ no âmbito cível
O relator lembrou que a Segunda Turma, ao julgar o REsp 1.325.491, afirmou a necessidade de uma distinção (distinguishing) na aplicação das Súmulas 208 e 209 em processos cíveis.
“Nas ações de ressarcimento ao erário e improbidade administrativa ajuizadas em face de eventuais irregularidades praticadas na utilização ou prestação de contas de valores decorrentes de convênio federal, o simples fato de as verbas estarem sujeitas à prestação de contas perante o Tribunal de Contas da União, por si só, não justifica a competência da Justiça Federal”, complementou Mauro Campbell Marques, ressaltando que há esse entendimento também no Supremo Tribunal Federal (STF).
No caso em julgamento, ao afastar a competência da Justiça Federal, o relator observou que não há nos polos do processo ente federal indicado no artigo 109, I, da CF/1988. “Ademais, não existe nenhuma manifestação de interesse em integrar o processo por parte de ente federal, e o juízo federal consignou que o interesse que prevalece restringe-se à órbita do município autor, o que atrai a competência da Justiça estadual”, concluiu.
TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO – TST
Demissão por força maior em razão da pandemia é convertida em dispensa sem justa causa
Demissão por força maior em razão da pandemia é convertida em dispensa sem justa causa
Para a 5ª Turma, a pandemia não autoriza essa modalidade de rescisão.
29/03/22 – A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso da Nutri Serv – Serviços em Alimentação Ltda., com sede em São Paulo (SP), contra decisão que afastou a dispensa por força maior de uma merendeira. Essa modalidade está prevista na CLT e em medida provisória vigente na época, em razão da pandemia da covid-19. Mas, para o colegiado, não foi comprovada a necessidade da empresa de adotá-la.
Dispensa
A merendeira, que trabalhava numa escola estadual em Lebon Régis (SC), foi demitida em abril de 2020, após quatro anos de contrato. Na reclamação trabalhista, ela disse que o motivo da dispensa fora a diminuição do serviço, em razão da suspensão das aulas depois da pandemia. Segundo ela, as parcelas rescisórias não foram pagas corretamente, e a empresa não emitiu as guias para saque do FGTS.
Força maior
Empresa de pequeno porte, a Nutri Serv argumentou que as verbas foram pagas conforme a modalidade de ruptura por força maior, prevista na CLT como “todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente”. Ocorrendo esse motivo, o empregado tem direito à metade da indenização que seria devida em caso de rescisão sem justa causa.
A empresa alegou, também, que sua atividade – fornecer merenda escolar – ficou parada durante a pandemia e, por essa razão, não houve faturamento. Na sua avaliação, esse contexto permitiria a opção pela modalidade, de acordo com a Medida Provisória (MP) 927/2020, que previa que o estado de calamidade pública gerado pela pandemia da covid-19 constituiria hipótese de força maior para fins trabalhistas.
Dispensa imotivada
O juízo da Vara do Trabalho de Fraiburgo (SC) e o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região declararam nula a dispensa por força maior e acolheram o pedido de reversão para sem justa causa. Para o TRT, cabia ao empregador provar a extinção da empresa por fatos alheios à sua vontade. “Dificuldades transitórias ou momentâneas não justificam rescisões contratuais por esses motivos, sobretudo tendo-se em vista que cabe ao empregador assumir os riscos das atividades”, declarou.
Covid-19
Para o relator do recurso da empresa, ministro Douglas Alencar Rodrigues, os fatos apresentados pelo TRT não indicam a presença dos requisitos que legitimam a rescisão contratual por força maior. Segundo ele, embora a empresa tenha buscado demonstrar que deveria pagar pela metade as verbas rescisórias em tal contexto, a própria MP 927 não induzia a essa conclusão. “A redução somente é autorizada em lei se houver fechamento da empresa ou de um de seus estabelecimentos, como se constata do teor do artigo 502, inciso II, da CLT”, assinalou
O ministro ressaltou que os preceitos que disciplinam a força maior e seus impactos nas relações de trabalho exigem a comprovação do expressivo impacto da força maior sobre a atividade econômica explorada, “com a indesejável situação de extinção ou redução das atividades”.
A decisão foi unânime.
(RR/CF)
Processo: RR-464-18.2020.5.12.0049
Corretor não consegue reconhecimento de vínculo com imobiliária
Corretor não consegue reconhecimento de vínculo com imobiliária
Não foram identificados os requisitos da relação de emprego, como a subordinação.
29/03/22 – A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão que não reconhecera vínculo de emprego entre um corretor de imóveis de Curitiba (PR) e a Thá Pronto Consultoria de Imóveis S.A. Ele corretor tentava provar a existência de subordinação jurídica em relação à imobiliária e a acusava de fraude na contratação, mas prevaleceu, para o colegiado, a conclusão de que a situação não tinha os requisitos para configurar a relação de emprego.
Plantão
O corretor disse, na ação trabalhista, que passara um ano vendendo apenas produtos da Thá, que não podia se fazer substituir e que cumpria jornada diária no plantão de vendas, de segunda a segunda, com 40 minutos de intervalo. Após o plantão, segundo ele, trabalhava ainda à distância por mais duas horas diárias no sistema on-line da imobiliária, em atendimento a clientes e pelo chat. Ele pediu a nulidade do contrato de prestação de serviço como autônomo e a assinatura da carteira de trabalho.
Autonomia e risco
Por sua vez, a Thá sustentou que não tem nenhum corretor com vínculo celetista e que a comissão de venda é paga pelos clientes, separando a parte do corretor e a parte da empresa. “Não existia onerosidade, visto que o pagamento pela corretagem era feito pelos clientes que adquiriam os imóveis, e não pela empresa”, alegou. Segundo a empresa, o corretor também tinha total autonomia, com risco assumido, pois, “caso não efetuasse nenhuma venda no mês, não receberia nenhuma comissão”.
A definição dos elementos que caracterizam o vínculo de trabalho está prevista na CLT (artigos 2º e 3º): subordinação, pessoalidade, onerosidade e não eventualidade em relação às atividades exercidas para a empregadora.
Serviços autônomos
O juízo da 18ª Vara do Trabalho de Curitiba e o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) indeferiram o pedido do corretor. Na avaliação do TRT, o contrato escrito de prestação de serviços autônomos de corretagem era válido, “sobretudo porque formalizado por trabalhador com discernimento suficiente para entender o alcance do que foi pactuado”.
Prestação jurisdicional
Contra a decisão, o corretor recorreu ao TST argumentando que o TRT teria deixado de se manifestar sobre questões importantes levantadas no recurso, como as alegações de que a prestação de serviços era realizada de maneira pessoal, de que havia controle das atividades por meio de relatórios e de que não poderia ser substituído por outro profissional. O corretor pediu no recurso a nulidade do julgamento pelo TRT por falta de prestação jurisdicional.
Forma expressa
Na avaliação da relatora, ministra Delaíde Miranda Arantes, o TRT se manifestou de forma expressa sobre todos os pontos necessários para o julgamento do processo para concluir pela ausência de subordinação e pela validade do contrato escrito de prestação de serviços autônomos de corretagem. “A decisão, além de se encontrar devidamente motivada, resolve de forma lógica e coesa as questões postas em juízo”, assinalou.
A ministra lembrou, ainda, que os julgadores não estão obrigados a examinar exaustivamente todos os argumentos trazidos pelas partes no processo para que suas decisões sejam proferidas de forma fundamentada.
A decisão foi unânime.
(RR/CF)
Processo: Ag-AIRR-10916-47.2016.5.09.0652
Gerente dispensado poderá comprar ações da empresa antes de completar período de carência
Gerente dispensado poderá comprar ações da empresa antes de completar período de carência
Para a 6ª Turma, a dispensa imotivada impediu o exercício do direito
30/03/21 – A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou a pretensão da Technip Brasil – Engenharia, Instalações e Apoio Marítimo, sediada no Rio de Janeiro (RJ), de não ter de pagar a um gerente de projetos o valor correspondente aos lotes de ações da empresa que ele teria direito de adquirir, se não tivesse sido dispensado, sem justa causa, antes de completar o período de carência exigido. Para o colegiado, a empresa não pode se valer da dispensa imotivada, durante o prazo de carência, para impedir o empregado de exercer o seu direito de compra.
Plano de compra de ações
O gerente de projetos foi admitido em agosto de 2007 e dispensado, sem justa causa, em junho de 2013. Na reclamação, disse que a Technip negara o seu pedido de entrega de ações, garantidas contratualmente, com a alegação de que ele perdera o direito em razão da dispensa. Ele sustentou que, segundo norma da empresa, a dispensa sem justa causa não afasta o direito ao benefício.
Carência exigida
A Technip, em sua defesa, argumentou que o chamado stock option plan é um plano que garante a alguns empregados o direito de adquirir lotes de ações da empresa depois de cumprido determinado período de carência. Seu argumento foi que, no caso, havia mera expectativa de direito do gerente e que a compra das ações não seria possível pelo fato de ele não trabalhar mais para a empresa no período de carência exigido.
Condição potestativa
O Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) reconheceu a validade do período de carência estabelecido pela empresa, pois esse seria um requisito inerente aos planos de compra de ações. Entretanto, entendeu que se trata da chamada condição potestativa, ou unilateral, vedada pelo artigo 122 do Código Civil.
Segundo o TRT, não se pode transferir para o empregador a concretização do direito do empregado. Do contrário, a empresa sempre poderá se valer da dispensa para barrar a compra das ações. Com esse fundamento, a Technip foi condenada a pagar o valor correspondente aos lotes de ações requeridos, com a observância do valor de mercado na época do efetivo pagamento.
Direito barrado
O relator do recurso de revista da Technip, ministro Augusto César, destacou que o período de carência estabelecido nas stock options corresponde a uma condição suspensiva lícita. Contudo, a cláusula específica que permite à empresa romper imotivadamente o contrato de trabalho e, por consequência, frustrar a aquisição das ações pelo empregado é condição meramente potestativa, como entendera o TRT.
Segundo o relator, seria diferente se o caso envolvesse pedido de demissão, dispensa por justa causa ou motivada. Desse modo, o ministro observou que, mesmo que o período de carência seja uma condição lícita, seu implemento teria sido obstado, maliciosamente, pela outra parte. Nessas condições, a condição é considerada cumprida, conforme prevê o artigo 129 do Código Civil.
A decisão foi unânime.
(LF/CF)
Processo: ARR-10886-57.2015.5.01.0009
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