Supremo Tribunal Federal (STF)
União não pode tomar insumos para vacina comprados por estados, diz STF
O governo federal não pode se apropriar dos bens ou serviços providenciados por um estado ou município, pois isso fere a autonomia constitucional dos entes da Federação.
O entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal ao referendar liminar do ministro Ricardo Lewandowski, que impediu a União de se apropriar dos instrumentos para a vacinação contra a Covid-19, como agulhas e seringas, que foram contratados pelo estado de São Paulo.
Por unanimidade, o Supremo acolheu ação ajuizada pela Procuradoria do Estado de São Paulo, que contou que a União fez a requisição administrativa de seringas e agulhas que o estado tinha comprado para executar o Plano Estadual de Imunização.
Porém, a requisição administrativa não pode, segundo Lewandowski, ser contra o próprio Estado. Os entes da Federação não são superiores uns aos outros, senão nas competências definidas pela Constituição, o que não é o caso dos autos.
Além disso, a jurisprudência da Corte impede a requisição nesses moldes. Dentre os precedentes citados por Lewandowski está uma ação, de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, em que a União foi impedida de pedir respiradores pulmonares adquiridos pelo Estado de Mato Grosso (ACO 3.393).
Sob as mesmas circunstâncias, o ministro Celso de Mello também determinou a entrega ao Estado do Maranhão de respiradores pulmonares previamente adquiridos por contrato administrativo (ACO 3.385).
“A incúria do Governo Federal não pode penalizar a diligência da administração do Estado de São Paulo, a qual vem se preparando, de longa data, com o devido zelo para enfrentar a atual crise sanitária”, afirmou Lewandowski.
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ACO 3.463
Petrobras não é obrigada a seguir Lei de Licitações, decide Supremo
As empresas de economia mista sujeitas à ampla concorrência do mercado não devem seguir as restrições impostas pela Lei de Licitações para contratação de serviços. O regime da lei é incompatível com a agilidade própria do mercado privado, movido pela intensa concorrência entre empresas.
Esse foi o entendimento que prevaleceu no julgamento virtual encerrado nesta sexta-feira (5/3), mais de dez anos após o seu início, para decidir se a Petrobras deveria ou não se sujeitar à Lei 8.666/93, a Lei de Licitações.
No caso em discussão, a Petrobras cancelou, em 1994, um contrato de fretamento de navios de cargas que tinha sido assinado com a Frota Petroleiros do Sul (Petrosul), e contratou outra empresa sem licitação. A transportadora questionou a rescisão alegando violação ao artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, que prevê a licitação como regra para as contratações da administração pública, incluindo as sociedades de economia mista, e pretendia a anulação do ato administrativo e indenização por perdas e danos.
Na ocasião, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) entendeu que o parágrafo único do artigo 1º da Lei de Licitações não se aplicaria à Petrobras. A decisão teve por fundamento a redação original, vigente à época, do artigo 173, parágrafo 1º, da Constituição, que dizia que as sociedades de economia mista que exploram atividade econômica se sujeitam ao regime jurídico próprio das empresas privadas.
No Supremo, a maioria dos ministros acompanhou o voto do relator, Dias Toffoli, para desprover o recurso e manter a decisão do TJ-RS. Segundo ele, “a agilidade que se exige das empresas que atuam no mercado é absolutamente incompatível com um sistema rígido de licitação, como esse imposto pela referida Lei nº 8.666/93”.
Como os fatos ocorreram em 1994, ainda não estavam vigentes várias normas posteriores que disciplinaram o assunto, o que também foi debatido pelos ministros. As inovações introduzidas desde então incluem a Emenda Constitucional 9/1995, que flexibilizou o monopólio estatal na atividade petrolífera; a Lei do Petróleo (Lei 9.478/1997); a Emenda Constitucional 19/1998, que alterou aspectos relativos à licitação da administração pública; e o Decreto 2.745/1998, que estabeleceu o Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da Petrobras.
Para Dias Toffoli, as novas normas apenas reforçaram a previsão constitucional original. “A compreensão dessa realidade, ou seja, de que tais empresas que assim atuam no mercado, sujeitam-se ao regime jurídico de direito privado, é inerente ao sistema criado pela Constituição Federal, atribuindo-se à sociedade de economia mista a exposição, a exploração de atividades econômicas (comercialização de bens ou de prestação de serviços) e o mesmo regime das empresas de direito privado”, explicou.
Ao entendimento, Gilmar Mendes acrescentou a evolução da doutrina na interpretação da Lei de Licitações. Segundo ele, a norma foi editada para evitar corrupção nas esferas administrativas do Estado e, assim, tinha pretensão totalizante, abarcando inclusive as estatais. No entanto, não demorou para ficar claro que a lei aumentava a burocracia sem combater possíveis ilícitos.
Para resolver o problema, editou-se a EC 19/1998, modificando os artigos artigo 22, inciso XXVII, e 173 da Constituição. Quando isso aconteceu, lembra Gilmar, o Congresso ficou inerte, o que levou a um impasse sobre a incidência da Lei de Licitações para estatais. A doutrina jurídica resolveu o problema procedendo a duas demarcações: uma delas considerava que o objeto de atuação da empresa era determinante e, assim, a Lei das Licitações não abarcava os casos em que o Estado atuava em regime de competição; a outra diferenciava atividade-meio e atividade-fim, considerando que a Lei de Licitações seria aplicável às estatais exceto quando fosse nociva à atividade de mercado.
“Essas duas questões, aliás, permaneceram em aberto até a edição da Lei 13.303/2016, que dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios”, prossegue o ministro.
As interpretações e aperfeiçoamentos posteriores não podem ser aplicados retroativamente, afirma Gilmar, mas mostram que “a história legislativa do Estado-empresário é uma crônica de sucessivas tentativas de dotar as empresas estatais de maior condição de competitividade com o setor privado” desde a promulgação da Constituição, em 1988. Assim, justifica-se o entendimento de que a Petrobras não precisava seguir a Lei de Licitações mesmo antes das diretrizes subsequentes que deixaram o entendimento ainda mais claro.
Além de Gilmar, o voto do relator foi seguido por Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Alexandre de Moraes. Ficaram vencidos os ministro Marco Aurélio, Luiz Edson Fachin, Rosa Weber e Cármen Lúcia. O ministro Luís Roberto Barroso se declarou suspeito.
Histórico
O Recurso Especial começou a ser julgado pela 1ª Turma do STF em 2008, mas o processo foi encaminhado ao Plenário. Em 2011, Dias Toffoli já tinha proferido o voto que acabou vencedor. Na ocasião, Marco Aurélio divergiu, sustentando que o artigo 37, inciso XXI, da Constituição abrange necessariamente as sociedades de economia mista.
Em 2016, o julgamento foi retomado com voto-vista do ministro Luiz Fux. Ele acompanhou o relator, ressaltando que o entendimento não é uma “carta de alforria”. Segundo Fux, a Petrobras, enquanto sociedade de economia mista, não se desobriga da observância das normas jurídicas da Administração Pública, “mas fica dispensada das regras da Lei 8.666 quando estas puderem comprometer a sua competitividade, que é o que se presume no caso”. Toffoli, então, reajustou seu voto para incluir as considerações feitas por Fux.
Ainda naquele ano, a divergência aberta por Marco Aurélio foi integralmente seguida pelo ministro Luiz Edson Fachin, bem como pelas ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia. O julgamento foi então novamente suspenso para aguardar os votos de Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, que estavam ausentes da sessão.
O ministro Teori Zavascki tinha acompanhado o voto de Fux e Toffoli naquela sessão. Em outubro de 2016, houve novo adiamento, atendendo a pedido do Tribunal de Contas da União. O processo foi novamente pautado em 2020, mas o relator, Dias Toffoli, pediu destaque porque ainda não tinha sido resolvida uma controvérsia relativa ao voto de Teori.
Fux, então, enquanto presidente, decidiu que o ministro deveria ter sido declarado impedido de votar nesse julgamento, por ter atuado como relator do Agravo de Instrumento perante o Superior Tribunal de Justiça (art. 144, II, do CPC). O voto de Teori foi anulado em dezembro de 2020, e o julgamento retomado agora, no final de fevereiro de 2021.
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RE 441.280
Supremo confirma que advogados públicos podem receber honorários sucumbenciais
A possibilidade de advogados públicos perceberem verbas honorárias sucumbenciais não afasta a incidência do teto remuneratório dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Com esse entendimento, o STF manteve decisão que reconhece o direito de advogados públicos receberem honorários sucumbenciais.
A corte rejeitou embargos de declaração interpostos pela Procuradoria-Geral da República. A corte, por unanimidade, seguiu o voto do ministro Alexandre de Moraes, relator dos embargos.
Ao recorrer, a PGR pediu que ficasse expressamente anotado na decisão “a aplicação, para o pagamento de honorários de sucumbência a advogados públicos, do limite do teto remuneratório constitucionalmente estabelecidos para os servidores de cada esfera da Federação (artigo 37, XI, da CF)”. Também disse que o Supremo deixou de se manifestar sobre a constitucionalidade de três trechos da Lei 13.327/16, que dispõe sobre a remuneração de servidores públicos.
Para Alexandre, não houve omissão na decisão recorrida. “Como se constata, a decisão proferida por esta Suprema Corte foi expressa ao consignar, como absolutamente necessária, a aplicação do limitador constante do artigo 37, XI, da Constituição Federal, o que atrai a incidência, por evidente, do limite do teto remuneratório constitucionalmente estabelecido para os servidores de cada esfera da Federação, escalonados a partir do subsídio mensal, em espécie, dos ministros do Supremo Tribunal Federal”, disse o ministro.
Alexandre também pontuou que não prosperam os questionamentos de que o STF deixou de apreciar a constitucionalidade de trechos da Lei 13.327, já que as previsões eram apenas desdobramentos do ponto de discussão central, discutido no mérito.
Para Alberto Simonetti, secretário-geral da OAB nacional e coordenador de comissões da entidade, a decisão representa uma vitória da advocacia.
“É a consolidação de uma grante luta de todas as entidades da advocacia pública, que contou com o apoio e a liderança da OAB. Todos os advogados possuem direito a honorários dignos e valorizados”, afirmou.
Honorários
O julgamento que reconheceu o direito de advogados públicos receberem honorários sucumbenciais aconteceu em julho do ano passado. Na ocasião, a maior parte da corte seguiu voto divergente aberto por Alexandre. Ficou vencido o relator da ADI, ministro Marco Aurélio.
Ao julgar o mérito, Alexandre entendeu que a natureza constitucional dos serviços prestados pelos advogados públicos possibilita o recebimento dos honorários. Por outro lado, a soma de subsídios e honorários mensais não pode exceder o teto remuneratório dos ministros do STF.
Marco Aurélio, por outro lado, argumentou que a valorização dos integrantes da advocacia pública não legitima possíveis atropelos e “atalhos à margem do figurino constitucional”.
“Por imposição do princípio constitucional da publicidade, a desaguar na busca pela transparência na gestão administrativa, o patamar remuneratório dos agentes públicos há de ser fixado a partir do orçamento do órgão [em que o advogado público atua] ante as possibilidades advindas do que arrecadado a título de tributos”.
ADI 6.053
Tribunal Superior do Trabalho (TST)
Operador receberá extras pela supressão do intervalo para recuperação térmica
O trabalho realizado além dos níveis de tolerância ao calor gera o direito não apenas ao adicional de insalubridade, mas também aos intervalos para recuperação térmica, cuja supressão dá direito ao pagamento de horas extras.
Foi com esse entendimento que a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Alpargatas S.A. a pagar horas extras a um operador de serigrafia pela supressão do intervalo para recuperação térmica no serviço realizado em ambiente quente. Apesar de o trabalhador ter conseguido, na Justiça, receber adicional de insalubridade pela exposição ao calor, o colegiado entendeu que as horas extras também são devidas, porque as duas parcelas têm naturezas distintas, e os intervalos não anulam o fator insalubre.
Após obter, em outro processo, o direito ao adicional, o empregado apresentou reclamação trabalhista para pedir o pagamento das horas extras. O motivo, segundo ele, era que a empresa não concedia intervalo de 30 minutos para cada meia hora de trabalho, apesar de a pausa ser prevista no Anexo 3 da Norma Regulamentadora (NR) 15 do extinto Ministério do Trabalho (atual Secretaria Especial de Previdência e Trabalho).
Dupla punição
O juízo da 1ª Vara do Trabalho de Campina Grande (PB) condenou a Alpargatas ao pagamento das horas extras, ao constatar que o serviço era realizado em temperatura de cerca de 28º C, acima do limite permitido pela NR, sem o descanso previsto. O Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região, no entanto, reformou a decisão para afastar o direito às horas extras, com o entendimento de que, diante da condenação ao pagamento do adicional de insalubridade pela não concessão do intervalo para recuperação térmica, é indevido o pagamento de horas extras pela sua supressão. Caso o contrário, ocorreria dupla punição ao empregador pelo mesmo fato.
Natureza diversa
O relator do recurso de revista do operador, ministro Alberto Bresciani, assinalou que a cumulação das duas parcelas não caracteriza dupla punição, pois a exposição contínua ao agente insalubre não é afastada pelas pausas. “São verbas de natureza diversa devidas distintamente”, observou. Com informações da assessoria de imprensa do TST.
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243-71.2019.5.13.0007
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