Supremo Tribunal Federal (STF)
Supremo volta a negar modulação de efeitos em caso sobre guerra fiscal
Em julgamento virtual encerrado na quarta-feira (5/8), o Plenário do Supremo Tribunal Federal negou pedido de modulação temporal dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade de benefício fiscal concedido por governo estadual sem a aprovação do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
A decisão foi tomada em ação que declarou a inconstitucionalidade de norma fluminense que reduziu alíquota do ICMS sem a existência de consenso, mediante convênio, entre os demais Estados. Trata-se da chamada guerra fiscal.
A edição de normas por variados estados gerou enxurrada de ADIs no Supremo, e em 1º de junho de 2011 o Plenário julgou 14. Contra cinco delas houve pedido de modulação, sob justificativa de que a invalidação de benefícios fiscais já concedidos poderia provocar o pagamento em série de impostos atrasados por contribuintes.
Na quarta, o Supremo negou o último desses pedidos específicos, contrariando tendência recente. Em alguns casos igualmente referentes a guerra fiscal, já em 2015, o Plenário chegou a se adiantar a embargos e decretar os efeitos da inconstitucionalidade da norma estadual a partir da data de julgamento.
Ex nunc
A modulação dos efeitos de uma decisão é o que, em latim, os ministros do Supremo chamam de efeito ex nunc. Ou, em português, “daqui em diante”. Foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro por meio do artigo 27 da Lei 9.868/1999 (lei que regula a ADI e a Ação Declaratória de Constitucionalidade), por iniciativa do ministro Gilmar Mendes, do STF.
O Supremo já modulou os efeitos de decisões tomadas em ADI, mas variou de posição em casos de guerra fiscal. Quando foi favorável, assim o fez pela “ponderação entre a disposição constitucional e os princípios da boa-fé e da segurança jurídica”.
Já no julgamento mais recente, o entendimento é que a modulação consistiria, em essência, incentivo à guerra fiscal. Sabendo dessa possibilidade, estados poderiam editar normas e garantir vigência até que o Supremo eventualmente as derrubasse.
“Surge necessário resistir à mitigação dos pronunciamentos do Supremo, uma vez assentado o conflito de lei com a Constituição Federal. Toda norma editada em desarmonia com esta última é nula, natimorta”, apontou o ministro Marco Aurélio, no último dos 14 casos definidos em junho de 2011. Os outros 13 já transitaram em julgado, também sem modulação.
Voto vencido
A decisão foi por maioria, em embargos de declaração. Seguiram o relator os ministros Ricardo Lewandowski, Luiz Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux.
Ficaram vencidos os ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli. O posicionamento é pela aplicação dos efeitos a partir da decisão do Supremo, em 1º de junho de 2011, preservando os efeitos da norma, que fora editada em 29 de setembro de 2003.
“Tratando-se de ato normativo que vigeu e produziu efeitos por quase de oito anos, com a presunção de sua constitucionalidade pelos contribuintes do tributo, a situação enseja a necessária proteção das expectativas legitimamente criadas”, opinou o ministro Gilmar Mendes.
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ADI 3.674
Pessoa física não pode ingressar em ação como amicus curiae, diz STF
Apenas entidades podem ingressar como amicus curiae em ações, já que representam os interesses de um grupo específico, enquanto uma pessoa luta apenas por suas necessidades.
O entendimento é do Supremo Tribunal Federal, que negou a admissão de um procurador da Fazenda Nacional que pediu para ingressar como “amigo da corte”, como pessoa física, em uma ação. O julgamento nesta quinta-feira (6/8) foi unânime para negar o agravo.
O caso começou a ser analisado em 2012, quando o ministro Celso de Mello negou a admissão do procurador, sob argumento que as ações de controle de constitucionalidade abstrato discutem interesses coletivos, não sendo possível reconhecer situação individual.
Inicialmente, quatro ministros seguiram o entendimento do decano da corte para negar o recurso. Outros cinco concluíram que o agravo não deve ser conhecido. À época, o julgamento foi suspenso porque Cármen Lúcia estava ausente.
Foi conhecido do recurso de agravo, vencidos no conhecimento Fux, Toffoli, Ayres Britto, Fachin, Cármen. E na questão de fundo foi negado provimento ao agravo por unanimidade.
Ajuizada pelo Conselho Federal da OAB, a ação questiona o fato de relação empregatícia de advogados que atuam em órgãos públicos ser diferente da estabelecida pelo Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94).
Inicialmente, quatro ministros seguiram o entendimento do decano da corte e entenderam que o recurso deve ser conhecido e negado. Outros cinco concluíram que o agravo não deve ser conhecido. Como Cármen Lúcia estava ausente, o Plenário suspendeu o julgamento. Hoje, a ministra também negou o recurso.
Além de Celso de Mello, os ministros Cezar Peluso (aposentado), Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Rosa Weber admitem o agravo para negar o recurso. A corrente da divergência é composta pelos ministros Luiz Fux, Ayres Britto (aposentado), Dias Toffoli, Luiz Edson Fachin e Cármen Lúcia.
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ADI 3.396
Cartório não pode recusar fornecimento de certidões gratuitas à União, diz STF
Negar à União o fornecimento gratuito de certidões de seu interesse viola sua competência para legislar sobre registros públicos. Foi o que decidiu o Supremo Tribunal Federal ao julgar procedente ação contra atos de titulares de cartórios que recusaram fornecer certidões gratuitas. O julgamento em Plenário Virtual encerrou nesta terça-feira (4/8).
Para a maioria dos ministros, o ato do poder público que nega à União o fornecimento gratuito viola o artigo 236, § 2º, da Constituição Federal.
O voto condutor foi do ministro Alexandre de Moraes, que considerou que, ao instituir isenção para a União, o Decreto-Lei 1.537/1977 apenas disciplinou um tema da própria função pública exercida pelos notários e registradores.
“O fato de exercer de forma privada a atividade notarial/registral não descaracteriza a função pública do serviço delegado pelo Estado”, explicou. Seu voto foi acompanhado pelos ministros Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli e Celso de Mello.
Numa linha mais restrita, o ministro Luiz Edson Fachin apontou que a previsão da isenção para a União não contraria as outras normas vigentes. “Ao emitir comando passível de aplicabilidade federativamente uniforme, consoante a normas gerais, o Decreto-Lei 1.537/1977 foi recepcionado pela Constituição da República de 1988.” Seguiram o voto os ministros Rosa Weber, Cármen Lúcia e Luiz Fux.
Fora da Constituição
Ficou vencido o relator, ministro Marco Aurélio, que acolheu o argumento da não recepção do Decreto-Lei pela Constituição Federal. O vice-decano considerou que, embora os titulares de cartórios extrajudiciais estejam sujeitos ao regime jurídico de direito público, “a taxa é tributo cuja exigência se faz orientada pelo princípio da retributividade”.
Desta forma, concluiu que a Constituição não abrange em momento algum a dispensa da União do pagamento pela prestação de serviços públicos feitos por entidades privadas, “seja mediante a delegação decorrente de concessão, permissão, autorização ou concurso público, como acontece, na última hipótese, com os titulares dos cartórios extrajudiciais”.
Ele foi acompanhado pelo ministro Ricardo Lewandowski.
Recepção ou não
O caso chegou ao STF em 2009, ajuizado pelo então presidente Lula contra atos de titulares de cartórios e também contra os magistrados que determinaram o pagamento prévio pelos serviços notariais.
A principal alegação da peça, elaborada pela AGU, é a de que os cartórios desconsideraram o Decreto-Lei 1.537/77, que isenta a União do pagamento de custas e emolumentos aos ofícios e cartórios de registro de imóveis e aos ofícios e cartórios de registros de títulos e documentos. Para os cartórios, a norma não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988.
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ADPF 194
Justiça do Rio de Janeiro
Justiça suspende audiência pública sobre construção de autódromo no Rio
O Conselho Estadual de Meio Ambiente do Rio de Janeiro (Cema) deveria ter sido criado por lei, não por decreto. E as normas que permitiram audiências públicas virtuais do órgão durante a epidemia de coronavírus são inconstitucionais, pois não tiveram a devida publicidade.
Com esse entendimento, a 15ª Vara de Fazenda Pública do Rio de Janeiro suspendeu a audiência pública virtual do Cema desta sexta-feira (7/8) para discutir os impactos ambientais da construção do autódromo de Deodoro, na zona oeste da cidade.
A sessão é obrigatória para a apresentação do estudo de impacto ambiental e para a liberação da obra. A juíza Roseli Nalin também suspendeu outras audiências ou a concessão de licenças ambientais.
A audiência — presencial — estava marcada para março, mas foi suspensa por causa da epidemia de coronavírus. A Prefeitura do Rio tentou marcar uma sessão por videoconferência em maio. Mas o Ministério Público fluminense alegou que a norma geraria despesas desnecessárias no atual cenário, e a Justiça suspendeu a audiência.
Em recurso ao Supremo Tribunal Federal, a Prefeitura do Rio argumentou que a suspensão prejudicava a obra e poderia impedir o plano de receber a prova do Brasil da Fórmula 1 em 2021. Além disso, sustentou que a suspensão era uma interferência indevida em uma obra pública. O STF, em 17 de julho, autorizou a audiência pública virtual.
Nalin ressaltou que a criação do Cema pelo governo fluminense, através do Decreto-Lei 46.739/2019, sem lei anterior que o previsse, violou o princípio da legalidade administrativa.
A julgadora apontou que a composição do conselho é inconstitucional por desrespeitar a paridade e deixa de atender o interesse público. Além disso, ela disse que as resoluções que permitiram audiências públicas virtuais durante a epidemia de Covid-19 desrespeitaram o princípio da publicidade.
O custo do autódromo está previsto em R$ 700 milhões. Atualmente, a prova anual da Fórmula 1 no Brasil ocorre em São Paulo, no autódromo de Interlagos. No entanto, o contrato da capital paulista com a organizadora da prova vence em 2020, e o Rio está querendo atrair o evento para si.
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0150428-88.2020.8.19.0001
Superior Tribunal de Justiça (STJ)
Após 2002, direito de retenção por benfeitorias deve ser alegado na contestação
Embora o artigo 744 do Código de Processo Civil de 1973 previsse, em sua versão original, a possibilidade da apresentação de embargos de retenção por benfeitorias na fase de execução da sentença judicial, a reforma implementada pela Lei 10.444/2002 suprimiu essa hipótese, mantendo o direito aos embargos de retenção apenas nas execuções de títulos extrajudiciais para entrega de coisa certa.
Dessa forma, após o início da vigência da lei de 2002, cabe ao possuidor de boa-fé, quando for demandado em ação para entrega de coisa, como a saída do imóvel por perda de posse, pleitear a retenção de benfeitorias na própria contestação, sob pena de preclusão do exercício de seu direito. Entretanto, a perda do momento processual para alegar o direito à retenção não impede que o interessado, posteriormente, proponha ação ordinária de indenização pelo valor das benfeitorias realizadas.
O entendimento foi fixado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, que, por considerar que as alterações legislativas sobre o direito de retenção só entraram em vigor com a Lei 11.382/2006, admitiu a oposição de embargos à execução em processo de reintegração de posse iniciado em 2003.
Assinaturas falsas
Na ação de reintegração de posse que deu origem ao recurso, os autores buscaram anular um negócio imobiliário. Segundo os autos, um dos réus vendeu aos demais uma área rural que possuía em condomínio com os autores, sem ter havido a anuência destes, valendo-se de assinaturas falsificadas.
Julgada procedente a ação, na fase de cumprimento de sentença, iniciada em 2016, dois dos réus opuseram embargos à execução cumulada com pedido de retenção por benfeitorias. O juiz rejeitou a alegação de impossibilidade jurídica do pedido, decisão mantida pelo TJ-MT.
Para o tribunal, como a ação original de reintegração de posse foi proposta antes da entrada em vigor da Lei 11.382/2006, as sucessivas modificações legislativas que culminaram com a supressão dos embargos de retenção do sistema processual brasileiro não poderiam ser aplicadas ao caso dos autos.
Discussões superadas
A relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, explicou que o direito de retenção pode ser invocado pela defesa nas ações que visam à entrega de coisa, com o objetivo de paralisar a eficácia da pretensão do autor, adiando a devolução do bem para o momento do ressarcimento das despesas com as benfeitorias.
Segundo a ministra, durante a vigência do Código de Processo Civil de 1973, houve discussões sobre o momento adequado para o exercício do direito de retenção — se na contestação, sob pena de preclusão, ou se por meio de embargos à execução. Entretanto, de acordo com a relatora, desde a reforma introduzida pela Lei 10.444/2002 no CPC/1973, não são mais cabíveis embargos de retenção por benfeitorias em execuções de títulos judiciais, independentemente da natureza da ação.
“Pela reforma da Lei 10.444/2002, foi dada nova redação ao artigo 744 do CPC/1973, que passou a prever a possibilidade de oposição de embargos de retenção por benfeitorias apenas nas execuções de títulos extrajudiciais para entrega de coisa certa, de que tratava o artigo 621 daquele códex”, afirmou a ministra.
Distinções
Ainda de acordo com Nancy Andrighi, a Lei 10.444/2002 acrescentou ao CPC/1973 o artigo 461-A, que criou procedimento simplificado de obrigação de entrega de coisa reconhecida em decisão judicial, dispensando-se processo autônomo de execução. Nesse regime, apontou a relatora, como as funções jurisdicionais cognitiva e executória foram aglutinadas em apenas uma relação processual, não era mais concebível a possibilidade de oposição de embargos de retenção por benfeitorias, e a arguição deveria se dar na contestação.
“Assim, viabilizava-se que o direito de retenção fosse declarado na sentença, de modo a condicionar a expedição do mandado restituitório à indenização pelas benfeitorias”, detalhou a relatora. Posteriormente, disse a ministra, a Lei 11.382/2006 revogou o artigo 744 do CPC/1973 e estabeleceu o direito à retenção por benfeitorias como matéria passível de alegação em embargos à execução de título extrajudicial, que não têm paralelo com a impugnação do cumprimento de sentença.
Segundo Nancy Andrighi, essa orientação é mantida no CPC/2015, o qual, reforçando a distinção entre cumprimento de sentença e execução de título extrajudicial, estabelece expressamente que, na ação composta de duas fases, uma de conhecimento e outra de execução de sentença, o direito de retenção deve ser levantado na contestação (parágrafo 2º do artigo 538) e solucionado na sentença.
Debate concentrado
Ela destacou que a fixação da contestação como momento preclusivo para o exercício do direito de retenção remonta à reforma operada pela Lei 10.444/2002, cuja vigência é anterior à propositura da ação, em 2003 — e não pela Lei 11.382/2006, como entendeu o TJ-MT.
“Logo, mesmo sob o enfoque dado no acórdão recorrido, os embargos de retenção por benfeitorias se mostram incabíveis na espécie, haja vista que a lei processual vigente na data da contestação já havia excluído essa hipótese, impondo, por consequência, a concentração de todo o debate acerca do direito de retenção e o seu acertamento na fase cognitiva da ação”, enfatizou a ministra. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.
REsp 1.782.335
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