SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – STJ
Responsabilidade de banco por golpe com uso de conta digital exige demonstração de falta de diligência
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, decidiu que não houve defeito na prestação de serviço do banco digital em um episódio no qual estelionatários utilizaram uma conta digital para receber pagamentos de vítima do “golpe do leilão falso”. No caso das contas digitais, a abertura da conta e as operações bancárias são oferecidas pela instituição financeira exclusivamente pela internet.
Para o colegiado, independentemente de a instituição atuar apenas em meio digital, caso ela tenha cumprido com o seu dever de verificar e validar a identidade e a qualificação dos titulares da conta, além de prevenir a lavagem de dinheiro, não há defeito na prestação de serviço que atraia a sua responsabilidade objetiva. Por outro lado, se houver comprovação do descumprimento de diligências relacionadas à abertura da conta, está configurada a falha no dever de segurança.
No caso julgado, um homem, acreditando ter arrematado um veículo em leilão virtual, pagou boleto de R$ 47 mil emitido por um banco digital. Após efetuar o pagamento e não receber o carro, o homem percebeu que havia sido vítima do “golpe do leilão falso”, fraude em que estelionatários criam um site semelhante ao de empresas leiloeiras verdadeiras para enganar compradores.
Vítima apontou facilidade excessiva para criação da conta
Buscando reparação, a vítima ajuizou uma ação indenizatória por danos materiais contra o banco digital, sustentando que a facilidade excessiva na criação da conta bancária permitiu que o golpe fosse aplicado pelos estelionatários. A ação foi julgada improcedente em primeira instância, com sentença mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
Para o TJSP, além de a abertura da conta ter seguido os procedimentos definidos pelo Banco Central (Bacen), o autor do processo não teria agido com cautela ao se deixar enganar por uma oferta que era 70% inferior ao valor de mercado do veículo.
Ao STJ, a vítima argumentou que houve fortuito interno do banco, pois não teriam sido adotadas as medidas de segurança para evitar que estelionatários abrissem a conta digital. Ainda segundo a vítima, o banco deveria ter observado que a transferência realizada por ele era de valor elevado, considerando os padrões daquela conta bancária.
Bacen não especifica documentos necessários para a abertura de contas digitais
A ministra Nancy Andrighi, relatora, destacou que o Banco Central publicou a Resolução 4.753/2019, estabelecendo os requisitos que as instituições financeiras devem seguir na abertura, na manutenção e no encerramento de contas de depósito no meio digital. A ministra observou que, ao contrário da antiga Resolução 2.025/1993, a nova regulamentação não especifica as informações, os procedimentos e os documentos necessários para a abertura de contas, transferindo aos bancos a responsabilidade de definir o que é essencial para identificar e qualificar o titular da conta, por meio de um processo chamado de qualificação simplificada.
Nesse contexto, a relatora ressaltou que, quando a instituição financeira adota todos os mecanismos previstos nas regulações do Bacen – ainda que a conta bancária acabe sendo usada por estelionatários posteriormente –, não há falha na prestação de serviço bancário. Para Nancy Andrighi, adotar um entendimento contrário, no sentido de exigir documentação ou formalidade específica para a criação de conta no meio digital, deturparia o objetivo da regulamentação desse tipo de conta: a bancarização da população e o desenvolvimento econômico e social do país.
No caso dos autos, a ministra destacou que, como o correntista do banco digital era o estelionatário, não a vítima, é inaplicável o entendimento adotado em precedentes anteriores do STJ em que houve a responsabilização da instituição bancária porque as transações destoavam do perfil de movimentação dos correntistas.
Leia o acórdão no REsp 2.124.423.
Financeira condenada a devolver dinheiro a consumidora não pode compensar obrigação com parcelas não vencidas
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou decisão de segundo grau que havia permitido o uso de parcelas vincendas de um empréstimo para compensar o valor que a financeira terá de restituir a uma consumidora por força de condenação judicial. Para o colegiado, eventual contrapartida só pode ocorrer em relação a dívidas já vencidas.
Segundo os autos, a consumidora ajuizou ação de revisão contratual contra a financeira, alegando que o contrato de empréstimo conteria cláusulas abusivas. Na contestação, a empresa solicitou que, se condenada, pudesse compensar eventual devolução de dinheiro com o valor de parcelas do contrato que ainda iriam vencer, de modo a quitar o saldo devedor.
O juízo recalculou as taxas a serem aplicadas no contrato, de acordo com as aplicadas pelo mercado à época, e concedeu a compensação com as parcelas vincendas. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) manteve a decisão.
No recurso especial dirigido ao STJ, a consumidora sustentou que não seria possível a compensação das parcelas do contrato nesse caso, pois ainda não estavam vencidas.
Legislação prevê as hipóteses de compensação
A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que, de acordo com os artigos 368 e 369 do Código Civil, quando duas pessoas são ao mesmo tempo credoras e devedoras uma da outra, as obrigações se extinguem até onde se compensarem. Conforme ressaltou, essa regra somente pode ser aplicada nos casos de dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis.
A ministra apontou que, segundo a jurisprudência do STJ, para ser admitida a compensação de dívidas, deve haver reciprocidade dos créditos e homogeneidade entre as prestações.
Valor cobrado indevidamente deve ser devolvido ao consumidor
Para Nancy Andrighi, apesar de simples, a demanda merece atenção, pois impacta diretamente os contratos celebrados pelos consumidores brasileiros.
A relatora lembrou que, nos casos de créditos contestados, a parte ré pode requerer a sua compensação, como forma de evitar o pagamento do valor cobrado ou de reduzi-lo. Entretanto, ela apontou que o banco pretendia compensar as parcelas ainda não vencidas com o valor que deveria devolver à consumidora por ter cobrado taxas abusivas.
“A manutenção da sentença nos termos narrados poderia esvaziar a devolução dos valores cobrados indevidamente, sobretudo diante de contratos bancários de trato sucessivo”, concluiu.
Leia o acórdão no REsp 2.137.874.
Repetitivo discute se plano pode limitar cobertura a pacientes com transtorno global do desenvolvimento
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu submeter os Recursos Especiais 2.153.672 e 2.167.050, de relatoria do ministro Antonio Carlos Ferreira, ao julgamento sob o rito dos repetitivos.
A controvérsia, cadastrada na base de dados do STJ como Tema 1.295, diz respeito à “possibilidade ou não de o plano de saúde limitar ou recusar a cobertura de terapia multidisciplinar prescrita ao paciente com transtorno global do desenvolvimento”.
O colegiado determinou a suspensão dos recursos especiais ou agravos em recurso especial que tratem da mesma controvérsia, em segunda instância ou no STJ.
O relator apontou a existência de múltiplos recursos especiais com fundamento em idêntica questão de direito, muitos deles julgados recentemente no tribunal, o que revela a atualidade do tema e seu impacto sobre o volume de processos em tramitação na Justiça brasileira.
Tratamento integrado para TEA e transtorno global do desenvolvimento
Um dos recursos afetados pela Segunda Seção questiona decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que considerou legítima a recusa de cobertura de tratamentos médicos, meios e materiais não previstos no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ou no contrato, na hipótese de prescrição a paciente com transtorno do espectro autista (TEA).
O ministro Antonio Carlos Ferreira explicou que o TEA era considerado uma espécie de transtorno global do desenvolvimento, com tratamentos distintos para cada caso. No entanto, a edição mais recente do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) unificou os subgrupos anteriormente classificados como transtornos globais do desenvolvimento, passando a abordá-los de maneira integrada.
“Assim, não seria adequado focar exclusivamente no TEA, já que, atualmente, todos esses casos são tratados como parte de um mesmo grupo de transtornos globais do desenvolvimento”, esclareceu o relator.
Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica
O Código de Processo Civil de 2015 regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.
A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.
Leia o acórdão de afetação do REsp 2.153.672.
https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2025/30012025-Repetitivo-discute-se-plano-pode-limitar-cobertura-a-pacientes-com-transtorno-global-do-desenvolvimento.aspx
Plano não pode limitar sessões de psicomotricidade nem exigir formação do profissional em psicologia
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que as operadoras de plano de saúde são obrigadas a custear o tratamento de psicomotricidade sem limitar o número de sessões anuais, e não podem exigir formação em psicologia do profissional que presta o serviço.
Na origem, foi ajuizada ação de obrigação de fazer cumulada com ressarcimento de despesas médicas contra uma operadora, devido à negativa de cobertura de sessões de psicomotricidade prescritas como parte de tratamento multidisciplinar e realizadas por um enfermeiro.
As instâncias ordinárias julgaram procedente o pedido do autor. No recurso ao STJ, a operadora sustentou que, de acordo com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), não há obrigatoriedade de cobertura para sessões de psicomotricidade quando não são realizadas por psicólogo. Ainda assim – acrescentou a operadora –, a própria agência reguladora dispõe, em suas diretrizes, que é obrigatória a cobertura de apenas 18 sessões com psicólogo por ano.
Rol da ANS não limita o número de sessões
A relatora, ministra Nancy Andrighi, considerou indevida a recusa de cobertura das sessões, por parte da operadora, com a justificativa de que o atendimento deve ser feito por psicólogo.
Conforme a ministra explicou, “a atividade de psicomotricista é autorizada para quem tem pós-graduação nas áreas de saúde ou educação, desde que possuam também especialização em psicomotricidade”. Ela enfatizou que as informações constantes nas decisões das instâncias ordinárias permitem verificar que o serviço é prestado por especialista em psicomotricidade com a qualificação legal exigida.
A relatora ressaltou ainda que as sessões de psicomotricidade individual estão previstas no rol da ANS como procedimentos de reeducação e reabilitação no retardo do desenvolvimento psicomotor, sem diretrizes de utilização. Segundo a ministra, a ANS, ao atualizar o rol de procedimentos em 2022, excluiu critérios a serem observados para a cobertura de consultas, avaliações e sessões de alguns atendimentos, enquadrando-se entre eles a psicomotricidade.
“Por qualquer ângulo que se analise a questão, não prospera a pretensão da recorrente de limitar o tratamento a 18 sessões de psicomotricidade por ano de contrato”, concluiu.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Mesmo sem notificação prévia, seguradora não deve indenizar segurado que ficou muito tempo sem pagar
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não é devido o pagamento de indenização securitária quando, apesar de não ter havido comunicação prévia da seguradora sobre a resolução do contrato, o segurado ficou inadimplente por longo período antes da ocorrência do sinistro.
Segundo o processo, foi contratado um seguro em 2016, com vigência de cinco anos, mas o segurado pagou apenas oito das 58 parcelas acordadas no contrato. Em 2019, ocorreu o sinistro, e o segurado exigiu a indenização.
Diante da negativa da seguradora, amparada na falta de pagamento das parcelas, o segurado ajuizou a ação de cobrança, que foi julgada improcedente. O tribunal de segunda instância, entretanto, reformou a sentença por entender que a seguradora não comprovou a prévia comunicação ao segurado a respeito do atraso no pagamento.
No recurso especial dirigido ao STJ, a seguradora sustentou que a indenização não seria devida em razão do longo tempo em que o segurado permaneceu inadimplente.
Seguradora precisa notificar o segurado sobre o atraso das parcelas
A relatora, ministra Nancy Andrighi, apontou que o artigo 763 do Código Civil (CC) determina que o segurado que estiver em atraso com o pagamento não terá o direito de receber a indenização se o sinistro ocorrer antes da regularização do débito. Todavia, ela lembrou que a Segunda Seção adotou o entendimento de que, para se configurar a inadimplência tratada no dispositivo legal, é necessário que o segurado seja previamente notificado.
Essa posição está sedimentada na Súmula 616 do STJ, que dispõe que a indenização deve ser paga pela seguradora se ela não tiver enviado ao segurado a notificação prévia sobre o atraso das parcelas. “A lógica do entendimento é evitar a desvantagem exagerada para o segurado impontual, de forma conciliadora e razoável”, acrescentou a ministra.
Por outro lado, a relatora destacou que o STJ tem afastado excepcionalmente a aplicação da súmula nos casos em que o segurado está inadimplente por longo período e a seguradora não conseguiu comunicar a rescisão unilateral do contrato.
Conforme enfatizou a ministra, não há um prazo exato de inadimplência para afastar a súmula e admitir que a seguradora se recuse a pagar a indenização. Por isso, o tempo de atraso não pode ser a única condição a ser observada, sendo necessário analisar o contexto de cada caso, disse ela. De acordo com Nancy Andrighi, além do tempo de inadimplência, devem ser verificados outros aspectos, como o início de vigência do contrato, o percentual da obrigação que já foi cumprido e as condições pessoais do segurado, entre outros.
Comportamento do segurado violou o princípio da boa-fé
Ao dar provimento ao recurso da seguradora, a ministra ressaltou que, no caso, houve inadimplemento substancial e relevante do contrato, pois o segurado quitou apenas os oito primeiros meses e ficou sem pagar por 23 meses até a ocorrência do sinistro. Além disso, ela destacou que o segurado, por ser pessoa jurídica, tem conhecimento técnico suficiente para lidar com suas obrigações contratuais.
A relatora também enfatizou que, mesmo com a falta de comunicação ao segurado sobre a inadimplência, admitir o pagamento do prêmio sob essas circunstâncias desprezaria os deveres de boa-fé que são exigidos no cumprimento contratual.
“Em respeito ao princípio da boa-fé, não se pode admitir que a Súmula 616, que busca proteger o consumidor de uma onerosidade excessiva quando houver um mero atraso de pagamento, seja utilizada para fins espúrios, desviando-se de sua real finalidade de proteção ao consumidor, além de comprometer o equilíbrio contratual e a confiança entre as partes”, concluiu.
Leia o acórdão no REsp 2.160.515.
Vendedora de imóvel perde direito à execução extrajudicial por não ter registrado contrato com alienação fiduciária
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a vendedora de um imóvel com alienação fiduciária perdeu o direito à execução extrajudicial prevista na Lei 9.514/1997 por ter deixado deliberadamente de registrar o contrato durante dois anos, vindo a fazê-lo, com o nítido objetivo de afastar a incidência de outras normas, somente após a parte compradora ajuizar uma ação de rescisão contratual.
Na origem do caso, alegando falta de condições financeiras para levar adiante o negócio, os promitentes compradores de um lote ajuizaram a ação rescisória com pedido de restituição dos valores já pagos ao longo de dois anos. Após ser notificada do ajuizamento da ação, a empresa vendedora registrou o contrato – que continha cláusula de alienação fiduciária – e invocou a aplicação da Lei 9.514/1997, alegando a impossibilidade de rescisão.
Porém, o tribunal de origem aplicou ao caso o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e afastou a incidência do artigo 23 da Lei 9.514/1997, por entender que a empresa apenas fez o registro com o objetivo de afastar a aplicação da legislação e da jurisprudência menos benéficas aos seus interesses.
No STJ, a alienante sustentou que poderia optar por fazer o registro do contrato independentemente do tempo transcorrido e do ajuizamento da ação de rescisão contratual pelo adquirente.
Registro é requisito para execução extrajudicial previsto na legislação específica
A relatora, ministra Nancy Andrighi, lembrou que o artigo 23 da Lei 9.514/1997 dispõe que a propriedade fiduciária de imóvel é constituída com o registro do contrato no cartório imobiliário. Conforme explicou, nesse tipo de contrato de caráter resolutivo, o devedor adquire um imóvel, alienando-o ao credor como garantia do pagamento do próprio bem e, após a quitação, ocorre a extinção automática da propriedade do credor, a qual é revertida para o adquirente.
A ministra acrescentou que, no caso de não pagamento da dívida, acontece a consolidação da propriedade em nome do credor, que pode recorrer ao procedimento de execução extrajudicial, de acordo com os artigos 26 e 27 da Lei 9.514/1997. Mas, conforme já decidiu a Segunda Seção do STJ no Tema 1.095 dos recursos repetitivos, o registro do contrato é requisito indispensável para a aplicação da Lei 9.514/1997 e o afastamento do CDC.
Para Nancy Andrighi, “embora a ausência do registro não prejudique a validade e a eficácia do negócio jurídico, trata-se de requisito para a utilização do procedimento de execução extrajudicial previsto na Lei 9.514/1997”.
Supressio e boa-fé objetiva orientam solução do caso
A ministra ressaltou que a boa-fé objetiva e o instituto da supressio devem ser observados nos casos de contratos de alienação fiduciária de imóvel que não foram registrados durante longo período, por inércia deliberada do alienante. Conforme enfatizou, empresas que atuam no ramo imobiliário costumam deixar de registrar o contrato de alienação fiduciária para reduzir custos nas operações de venda.
A relatora explicou que, nesses casos, a relação existente entre as partes permanece sendo uma relação de direito pessoal, na qual pode incidir o Código Civil, o CDC e a Súmula 543 do STJ.
“Não se pode admitir que os contratos de venda de imóveis sejam submetidos ao absoluto critério do alienante quanto ao momento do registro e, assim, quanto à incidência da execução extrajudicial prevista na Lei 9.514/1997”, concluiu.
Leia o acórdão no REsp 2.135.500.
Repetitivo define que PIS e Cofins compõem base de cálculo do ICMS quando esta é o valor da operação
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.223), reafirmou o entendimento da corte no sentido de que o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) devem ser incluídos na base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), nas hipóteses em que a base de cálculo é o valor da operação, por configurar repasse econômico.
Com a definição da tese, podem voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial que estavam suspensos à espera da fixação do precedente qualificado.
O ministro Paulo Sérgio Domingues, relator dos recursos repetitivos, afirmou que não se aplica à controvérsia em julgamento a solução adotada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 69 da repercussão geral, conhecida como “tese do século”, que estabeleceu que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins”.
Imposto não se limita ao preço do produto
O relator destacou que, conforme estabelecido no julgamento do REsp 1.346.749, a base de cálculo do ICMS é o valor da operação que resulta na circulação da mercadoria, o que significa que o imposto não se limita ao preço do produto, mas também abrange o valor relativo às condições impostas ao comprador que são necessárias para a concretização do negócio. Dessa forma, de acordo com Domingues, o ICMS é calculado levando em consideração não apenas o preço da mercadoria, mas também os encargos e as exigências acordadas entre as partes envolvidas.
O ministro ressaltou que o PIS e a Cofins incidem sobre as receitas totais ou o faturamento das pessoas jurídicas, dependendo do regime de tributação adotado, com a observância das exceções legais. Segundo ele, as receitas e o faturamento devem ser considerados ingressos definitivos nas contas do contribuinte, sem qualquer caráter transitório, o que justifica a incidência do PIS e da Cofins e reforça a ideia de que essas contribuições impactam de forma efetiva a receita das empresas.
Para Domingues, embora o PIS e a Cofins sejam repassados economicamente ao contribuinte, sua incidência não recai diretamente sobre o valor final cobrado do consumidor. Ele apontou que isso os diferencia de tributos como o ICMS e o IPI, que têm um repasse jurídico autorizado pela legislação e pela Constituição. Assim, segundo o relator, o repasse do PIS e da Cofins ocorre de maneira indireta, refletindo no impacto econômico dessas contribuições, mas sem que haja uma transferência legalmente determinada da responsabilidade tributária.
Não há previsão legal que autorize a exclusão
O ministro lembrou ainda que, ao julgar o Tema 415 da repercussão geral, o STF entendeu que o repasse do PIS e da Cofins ao consumidor não viola a Constituição, pois se trata de um repasse de natureza econômica. Além disso, ele apontou que o próprio STJ, em diversas ocasiões, reconheceu a legalidade da inclusão do PIS e da Cofins na base de cálculo do ICMS, sempre com a justificativa de que o repasse é econômico, e não jurídico, como ocorre com outros tributos.
O relator também observou que a Constituição, em seu artigo 150, parágrafo 6º, estabelece que as exclusões da base de cálculo do ICMS devem ser previstas em lei. Como exemplo, ele citou o artigo 13, parágrafo 2º, da Lei Complementar 87/1996, que exclui o IPI da base de cálculo do ICMS em operações realizadas entre contribuintes, destinadas à industrialização ou à comercialização, que configuram o fato gerador de ambos os impostos. “Por ausência de previsão legal específica, não é possível excluir o PIS e a Cofins da base de cálculo do ICMS”, concluiu.
Leia o acórdão no REsp 2.091.202.
TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO – TST
Regras que alteram procedimentos sobre admissibilidade de recurso de revista entram em vigor em fevereiro
A partir de 24 de fevereiro, passarão a valer as novas regras aprovadas pelo Pleno do Tribunal Superior do Trabalho a respeito do recurso cabível contra decisão de Tribunal Regional do Trabalho (TRT) que negar seguimento a recurso de revista. As mudanças valem para os casos em que o acórdão questionado no recurso de revista estiver fundamentado em precedentes qualificados, como Incidentes de Recursos Repetitivos (IRR), Incidentes de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) e Incidentes de Assunção de Competência (IAC).
As alterações no texto da Instrução Normativa 40/2016 (que trata do tema) estão previstas na Resolução 224/2024. Com ela, o TST buscou esclarecer que também se aplicam ao processo do trabalho regras previstas no Código de Processo Civil (CPC) relacionadas à admissibilidade de recursos extraordinários (julgados pelas instâncias superiores) em temas que tratam de precedentes vinculantes.
Originalmente as mudanças passariam a valer 30 dias após a publicação da nova resolução. O período foi ampliado para 90 dias a pedido de TRTs e a fim de promover adaptações no sistema PJe. A prorrogação do prazo está prevista no Ato TST.GP 8/2025, publicado nesta terça-feira (14).
Mudanças na IN 40/2016
Artigo inserido pela resolução prevê que o agravo interno é o recurso cabível contra decisão tomada no TRT que negar seguimento a recurso de revista nos casos em que o acórdão questionado estiver fundamentado em decisões tomadas pelo TST no julgamento de IRR, IRDR ou IAC (precedentes que vinculam a Justiça do Trabalho). Não caberá mais, nesses casos, agravo de instrumento em recurso de revista (AIRR) ao Tribunal Superior do Trabalho. A mudança está em conformidade com os artigos 988, parágrafo 5°, 1.030, parágrafo 2°, e 1.021 do CPC, aplicáveis ao processo do trabalho.
A resolução também disciplina o procedimento que será adotado caso o recurso de revista tenha capítulo distinto que não trate de tema pacificado em precedentes qualificados. Nessas situações poderá ser ajuizado agravo de instrumento simultaneamente ao agravo interno. Entretanto, o processamento do agravo de instrumento ocorrerá somente após a decisão do TRT acerca do agravo interno.
Consolidação do sistema de precedentes
A atualização da IN 40/2016 é uma das medidas adotadas no ano passado pelo TST para dar mais eficiência e eficácia ao sistema recursal, consolidando o sistema de precedentes.
Em 2024, até novembro, o TST recebeu 314.836 agravos de instrumento em recurso de revista (quase 60% do total de novos processos) e julgou 291.353.
(Secom TST)
Motorista consegue desistir de ação mesmo sem concordância da empresa
- Um motorista desistiu de uma ação trabalhista na audiência, quando não houve conciliação.
- A empresa questionou a decisão, alegando que já tinha apresentado sua contestação e, por isso, a desistência dependeria de sua concordância.
- Mas, para a 5ª Turma do TST, a desistência ocorreu antes da contestação eletrônica ser analisada, pois estava em segredo, a pedido da própria empresa.
A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou examinar um recurso da FJKL Ferreira Empreendimentos Ltda. contra o acolhimento de um pedido de desistência da ação feito por um motorista, mesmo depois de a empresa ter apresentado sua contestação. Para o colegiado, a contestação era sigilosa e ainda não tinha sido examinada.
Motorista pediu vínculo, mas desistiu
O motorista ajuizou ação para obter vínculo de emprego com a FJKL, que atua no ramo de aluguel de máquinas e equipamentos pesados. Porém, na audiência na 2ª Vara do Trabalho de Marabá (PA), após recusada a conciliação, o advogado do trabalhador pediu a desistência da ação.
Empresa já tinha juntado contestação
A FJKL se opôs, alegando que, de acordo com a CLT (artigo 841) e o Código de Processo Civil (artigo 485), a parte autora não poderá desistir da ação após a apresentação da contestação sem anuência da outra parte. Mas o pedido foi aceito, e o processo foi extinto. A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região. Segundo o TRT, embora a empresa já tivesse juntado a contestação eletronicamente, ela estava em sigilo e, portanto, não tinha produzido efeitos jurídicos.
Desistência é aceita após tentativa de conciliação
O ministro Breno Medeiros, relator do recurso de revista da FJKL, destacou que o tema da desistência da ação após a contestação eletrônica era novidade nas Turmas do TST. Segundo o ministro, de acordo com a CLT e o CPC, o momento de apresentação da defesa é logo depois da tentativa de acordo, e a inserção antecipada da contestação no sistema eletrônico não muda essa previsão. Nesse sentido, o autor pode desistir da ação, sem a concordância da outra parte, até a audiência, após a tentativa de conciliação, porque é nesse momento em que se forma, de fato, a ação.
Ele salientou que a alteração promovida pela Reforma Trabalhista, em que a parte pode apresentar sua defesa pelo sistema judicial eletrônico, também tem como termo final a data da audiência, o que reforça a tese de que esse é o momento processual fixado em lei para que a defesa seja levada efetivamente em consideração.
A decisão foi unânime.
(Lourdes Tavares/CF)
Processo: RR-556-89.2023.5.08.0117
Negativa de rescisão indireta afasta indenização por estabilidade de gestante
- Uma trabalhadora pediu a rescisão indireta do contrato (“justa causa do empregador”) durante a licença-maternidade, alegando ter sofrido assédio moral, e o pagamento dos salários até o fim da licença.
- O pedido de rescisão indireta foi negado, reconhecendo-se que ela havia pedido demissão, mas o TRT-3 considerou que ela tinha direito à estabilidade.
- Para a 8ª Turma do TST, como o pedido de demissão foi reconhecido na Justiça e a empresa não cometeu nenhuma irregularidade, a trabalhadora não tem direito à indenização correspondente à estabilidade provisória.
A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou a indenização por estabilidade da gestante a uma estoquista da Saitama Veículos e Peças S.A. que não conseguiu o reconhecimento da rescisão indireta de seu contrato de trabalho. Segundo o colegiado, a iniciativa da ruptura do contrato partiu da empregada, e a empresa não cometeu nenhuma falta grave que tornasse insustentável a relação de emprego.
Assédio moral alegado não foi comprovado
Na ação trabalhista, ajuizada durante a licença-maternidade, a trabalhadora pediu o reconhecimento de rescisão indireta do contrato (ou “justa causa do empregador”) a partir do fim do afastamento e indenização por dano moral, alegando que seu chefe a tratava de forma excessivamente rigorosa.
Segundo seu relato, após notificar a empresa sobre a gravidez, ela teria tido suas atividades diminuídas e suas atribuições transferidas para outro empregado, de cargo inferior, e recebido uma advertência sem motivo.
No entanto, o juízo de primeiro grau entendeu que ela não conseguiu demonstrar suas alegações, ainda que por indícios, e julgou improcedentes os pedidos. Sendo inviável o rompimento do contrato por culpa do empregador, entendeu que o ajuizamento da ação deveria ser considerado renúncia ao período de estabilidade provisória.
Para TRT, demissão só vale no fim da licença
Com entendimento contrário, o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) afastou a renúncia à garantia provisória de emprego e reconheceu o direito da trabalhadora de receber as parcelas devidas no período estabilitário. Assim, o pedido de rescisão indireta foi reconhecido como pedido de demissão, com efeitos a partir do fim da licença-maternidade.
Empresa não cometeu falta grave
No recurso ao TST, a empresa argumentou que o afastamento “se deu por livre e espontânea vontade” da empregada e, por isso, não teria de arcar com a indenização estabilitária.
Para o relator do recurso de revista, ministro Sérgio Pinto Martins, tendo em vista que o pedido de rescisão indireta foi julgado improcedente, a iniciativa da ruptura do contrato de trabalho partiu da empregada gestante. Por outro lado, o empregador não cometeu nenhuma falta grave capaz de tornar insustentável a relação de emprego. Nessa situação, não é devida a estabilidade provisória.
Segundo o ministro, a delimitação dos fatos feita pelo TRT não permite ao TST concluir que o pedido de demissão foi inválido nem que houve dispensa arbitrária ou imotivada – hipóteses em que é devida a indenização substitutiva da garantia do emprego.
Pedido de demissão reconhecido em juízo
O relator destacou ainda que o TST tem entendimento consolidado de que é válido o pedido de demissão da gestante, desde que não seja demonstrado nenhum vício de consentimento capaz de invalidá-lo.
(Lourdes Tavares/CF)
Processo: RR-10873-21.2016.5.03.0089
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